quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

O aumento das passagens e a luta por um novo modelo de mobilidade urbana em BH

     É fim de ano em Belo Horizonte. E agora, como sempre ocorre, se avizinha um aumento da tarifa dos ônibus. Uma situação recorrente, à qual a população está acostumada e os movimentos sociais têm sempre denunciado (como o PSOL-BH fez em 2011). A passagem vai aumentar para R$2,80 no dia 29 de dezembro, o último sábado do ano. Um aumento de 6% em relação ao preço atual, e de mais de 33% em relação a 2008, quando a passagem custava R$ 2,10.

     A diferença deste para os outros anos é que desta vez não somos pegos de surpresa. O processo de luta por um transporte de qualidade gerou um acúmulo, um conhecimento sobre a causa que nos indica os caminhos pelos quais podemos lutar.

A atual situação

 
     Como está estruturado o transporte público em BH hoje? A cidade tem uma linha de metrô, que é administrada pelo governo federal e por isso recebe subsídio, já faz vários anos que a tarifa custa R$1,80.

     Os ônibus funcionam de outra forma. Pela Constituição Federal, esse tipo de transporte é de responsabilidade do município. Nossa prefeitura em 2008 fez uma licitação e concedeu a administração do sistema de ônibus para 4 consórcios. Cada consórcio ficou responsável pelos ônibus de uma parte da cidade. Na próxima vez que você descer de um ônibus, repare no que está escrito ao lado da porta traseira, é o nome do consórcio que administra sua linha (pode ser BH Leste, Consórcio Dez, Consórcio Pampulha e Consórcio Pedro II). A concessão é de 20 anos, de forma que se nada mudar, os mesmos empresários lucrarão com os ônibus até 2028.

      A grande questão é que no contrato assinado entre a PBH e essas empresas, há uma cláusula que as garante o lucro "sem riscos", à custa da população. A cláusula 9 garante que todo ano, no dia 29 de dezembro, a tarifa aumente de acordo com o aumento dos custos da empresa, que são salário, óleo diesel e manutenção em geral. Assim, desde que o contrato foi fechado a tarifa aumentou de R$2,10 para R$2,30, depois para R$2,45, depois para R$2,65 e agora aumentará para R$2,80. Nesse ritmo, de 6% de aumento ao ano, em 2014 pagaremos R$3,00 e ao fim do contrato pagaremos R$7,00 a viagem!

      Além do preço, há uma enormidade de problemas com os ônibus que qualquer passageiro pode listar. Os veículos são desconfortáveis (construídos em carrocerias de caminhão), as linhas são insuficientes e com horário reduzido: há bairros na cidade em que não há ônibus aos domingos, e – claro – os ônibus estão sempre lotados.


     Isso para não falar dos ônibus metropolitanos, que funcionam sob outra licitação, e são mais caros e precários ainda. Além disso, não há integração entre o cartão “Ótimo” e o cartão “BHBUS”, o que causa transtorno para todos aqueles que moram em um município da Região Metropolitana de Belo Horizonte e trabalham ou estudam em BH. Não é mais possível pensar na mobilidade em Belo Horizonte, sem levar em conta a Região Metropolitana.

O problema central: a concepção da mobilidade urbana em BH
      

A situação extremamente precária do transporte público em BH faz com que qualquer um que tenha a possibilidade opte por outra forma de se locomover pela cidade. Dessa maneira, quem pode comprar um carro ou uma moto o faz, e as conseqüências são rapidamente visíveis.

A frota de carros em Belo Horizonte aumenta 7,6% ao ano, isso significa que o número de carros dobra a cada 9 anos, e já estamos nos aproximando perigosamente da taxa de um carro para cada habitante da cidade. Esta média é maior que a da cidade de São Paulo! Não há mais espaço para carros nas ruas de BH e os acidentes e engarrafamentos diários demonstram a obviedade desse fato todos os dias.

     Diante dessa situação, o que o poder público tem feito? Usando o aumento do número de carros como motivo, Márcio Lacerda alardeou orgulhosamente o fato de estar realizando o maior programa de obras viárias da história da cidade. Acontece que a expansão de ruas e construção de viadutos não soluciona o problema principal – que é levar a população a considerar que a melhor maneira de se deslocar em BH é de carro. Pelo contrário, a política da Prefeitura retira o estímulo ao transporte público, por meio do aumento das passagens, e pela baixa abundância e qualidade do serviço, enquanto aumenta o estímulo a carros e motos, que ocupam mais espaço e levam menos gente, provocando engarrafamentos e poluindo mais.

     Um exemplo de que o atual modelo de mobilidade urbana não funciona é que São Paulo é a cidade com maior área de asfalto construída do Brasil e também a recordista em engarrafamentos. A marginal Tietê possui oito pistas em cada sentido, e está sempre entupida. Em BH, os viadutos da Lagoinha são o grande exemplo. A analogia fundamental por trás disso é a seguinte: o carro na cidade se comporta como o gás, ele ocupará todo espaço que estiver disponível, independentemente de quanto for.

      E assim, anualmente a Prefeitura reitera sua aposta no carro como solução do trânsito, fechando os olhos para o caos cotidiano. No orçamento para o ano de 2013, estão previstos cerca de R$ 250 milhões de reais para o programa “Corta-caminho”, que consiste basicamente na abertura de novas ruas, alargamento de ruas antigas e construção de viadutos. Enquanto isso, para o meio-passe estudantil está previsto apenas R$ 4 milhões. E a passagem de ônibus continua aumentando, com o passageiro arcando integralmente com os custos de manutenção do sistema e os lucros dos empresários.

A cidade para as pessoas: uma proposta de agenda de luta

      Diante da atrofia na qual a cidade se encontra, há um direcionamento claro da luta por uma mobilidade urbana digna: é necessário retomar o espaço da cidade para as pessoas. Nesse sentido, toda ação que priorize o pedestre, o ser humano em detrimento do carro, é válida e necessária.

      A população só optará livremente pelo transporte público quando este for, ao mesmo tempo, barato, abundante e de qualidade. Assim, há que se resistir aos aumentos e pressionar por um novo modelo de contrato de ônibus. Para isto, há algumas linhas de ação (alguns pontos foram baseados na proposta de código de transporte coletivo elaborada por Lúcio Gregori, além disso estes pontos estão sempre abertos a discussão):

· Atuar para que o processo de revisão do contrato entre a PBH e os consórcios de ônibus, previsto para 2013, seja o mais público possível e se dê no sentido da diminuição da tarifa e do fim da garantia anual de reajuste.

· Pressionar pelo fim do privilégio dos carros na cidade – fazendo com que recursos de programas como o “Corta-caminho” sejam realocados para um fundo público de transporte, que possibilite o aumento e melhoria da frota, o barateamento da passagem, e ampliação de gratuidades como o passe-livre.

· Pressionar a prefeitura e os consórcios de ônibus para que publicizem de maneira adequada e periódica os custos com o transporte público, a população atendida e o lucro auferido.

· Criar uma organização ampla e permanente de discussão e luta por um modelo de mobilidade urbana justo.

· Pressionar pela criação de um conselho municipal de tarifa e conselhos regionais de transporte público com a participação da sociedade civil, usuários, universidade, sindicatos e entidades de classe envolvidas.

· Lutar pela integração metropolitana do transporte público, com a unificação dos cartões Ótimo e BHBUS e por uma política de mobilidade integrada com os demais municípios.

      Por meio da mobilização aberta sempre a participação e a reformulações é que se pode ter alguma possibilidade de reverter o modelo segregador de mobilidade urbana de BH. O exemplo recente dos ciclistas urbanos da cidade, que denunciaram as ciclovias e ciclofaixas precariamente construídas e conseguiram o compromisso de reformulação por parte da PBH, é a demonstração de que é possível, além de necessário, realizar um planejamento urbano por fora do poder instituído e retomar o espaço da cidade para sua população.


Partido Socialismo e Liberdade - Belo Horizonte (PSOL-BH)

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